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Peregrinos do mundo novo

Homilia da Páscoa

 

 

Reunimo-nos nesta catedral, com o coração a transbordar de alegria, para cantarmos aleluias e hossanas. Porque somos sensíveis ao que celebramos, para nós, pessoas de fé, este é o dia mais festivo e feliz de todo o ano. Parece que as vozes, as músicas, as flores e todo o ambiente se associam para nos ajudarem a saborear a frase mais escutada em todo o mundo cristão: “O Senhor ressuscitou verdadeiramente. Aleluia!”. Sim, hoje é o dia da excelsa festa porque o Senhor que estava morto, agora vive glorioso para sempre. Ele é o verdadeiro Vivente, Aquele sobre quem a morte já não tem mais poder.

Mas para aqui chegarmos, ao longo de oito dias, desde o Domingo de Ramos, tivemos de realizar uma longa peregrinação espiritual: introduzimo-nos no meio da multidão de Jerusalém que aclamou a sua entrada na cidade santa; fomos com Ele ao cenáculo para ver de perto a maravilha da Eucaristia e do Sacerdócio que a celebra; acompanhamo-l’O, porventura com algumas lágrimas incontidas, na sua via dolorosa, desde o jardim das oliveiras, nos vários julgamentos e na condenação à morte e crucifixão; mas ontem e hoje também nos introduzimos no pequeno grupo dos seus amigos -encabeçado por Maria Madalena, com as outras mulheres e, depois, por Pedro e João- para confirmarmos com os nossos olhos que o túmulo está mesmo vazio e que a luz circundante não desmente que ressuscitou.

Esta longa peregrinação da nossa alma tocada pela fé, funciona como modelo ou protótipo da hodierna peregrinação do nosso mundo. Também este anseia chegar a um momento de vida em plenitude e com sentido, de alegria que seja autêntica, de fraternidade assumida, de convivência autenticamente familiar, de sadia colaboração para o bem de todos, de paz harmoniosa e definitiva, de uma luz que envolva a existência e a cultura humanas e lhes conceda grandeza e felicidade, de recusa do materialismo e abertura ao espiritual. Então, será a Páscoa do mundo. Mas o que agora vemos ainda é o desespero e o desânimo de tantos, lágrimas e mortes violentas, individualismos que criam cisão, retrocesso dos direitos humanos e fratura do que já se havia conseguido a nível da união e convivência dos povos, guerra e morte cientificamente programadas, o empobrecimento das nações e a privação da liberdade religiosa, enfim, falta de sentido, medos do futuro e a sempre possível guerra total.

Humanamente falando, parece que o nosso mundo copia, a papel químico, a peregrinação de Jesus: o manietar dos povos por potências mais fortes, como fizeram os soldados no jardim das oliveiras; a fantasia da aplicação do direito internacional, quando os poderosos o substituem pela sua vontade e desejo; a violação da dignidade pessoal, flagelando e coroando os outros de espinhos, só por sadismo; a indiferença perante a morte, o sofrimento e a fome; a rapina, como fizeram com a túnica inconsútil do Crucificado.

Mas esta peregrinação de Jesus não terminou no enterro e deposição no sepulcro. Depois de tudo isto e como desfecho de tudo isto, acontece a manhã radiante da Páscoa. E com ela, o mundo novo, pleno de alegria e ressurreição, de felicidade e razões de viver. É este mundo novo, possível e desejado, mundo no qual se implantam os grandes valores do Reino de Deus, que confirma as razões da nossa esperança. O mundo atual, frágil e desintegrado, há de transformar-se, pelo trabalho cultural da pessoa e pela bênção divina, em mundo coeso e bom, na plena correspondência ao plano inicial do Deus que o criou. É nessa novidade pascal que ousamos ter a certeza da contínua humanização, do fortalecimento dos direitos humanos e dos direitos dos povos e nações, de uma cultura de fraternidade como ideal tangível.

Jesus não foi ao encontro do nada, mas ao tudo de Deus. O mundo não se dissolverá no niilismo e na catástrofe nuclear, mas, redimido pelo Sangue de Cristo, chegará à glória do Reino, já experimentável no tempo da história e vivido em plenitude no que está para lá dela.

Ânimo, pois, caros cristãos. Não deixemos que nenhum sofrimento soterre as nossas razões de viver, pois o Senhor removeu todas as lápides sepulcrais. Cantemos a vida nova, já que Cristo é o garante dela. Ele está connosco. Por isso, que os aleluiaspascais acompanhem sempre a nossa existência. Ressuscitou! Sem deixar de estar com o Pai, também é nosso companheiro de viagem para nos assegurar o bem, expressão da salvação que nos trouxe.

A todos, boas festas pascais.

 

 

 

+ Manuel Linda 20 de abril de 2025