Os novos presbíteros formados no Seminário Maior do Porto e que foram ordenados no passado domingo, 9 de julho, apresentam o seu testemunho em registo vídeo que Voz Portucalense aqui apresenta, transcrevendo as suas palavras. Com os melhores votos de um feliz serviço.
Bruno Miguel Coelho Aguiar de Moreira, Maia
Sou o Bruno, tenho 37 anos, sou da paróquia de Moreira da Maia e, embora tenha feito um percurso habitual para a maioria dos cristãos – andei na catequese e até acabei por ficar como catequista – a verdade é que nunca quis ser padre. Nunca tinha posto essa hipótese, tanto que, quando chegou a altura de escolher a minha orientação vocacional, fui para o curso de biologia porque a minha intenção era fazer investigação científica. Acabei por tirar a licenciatura em biologia, fazer o mestrado e, inclusivamente, fiz o doutoramento na área da evolução. A verdade é que, quando estava a preparar a candidatura para o doutoramento, houve uma pessoa amiga que foi em peregrinação até Fátima, na altura do 13 de maio, e eu decidi acompanhá-la com uma mensagem diária. Curiosamente no dia 13 de maio decidi ir à missa, embora não fosse meu hábito fazê-lo. O facto de a homilia ter começado mais ou menos da mesma maneira que a mensagem que eu tinha escrito fez-me pensar que Deus me poderia estar a chamar para outro sítio. Na altura, também pertencia ao grupo de leitores, fazia parte do secretariado paroquial da catequese, mas a minha reação inicial a esse chamamento de Deus foi de rejeição, tanto que durante cerca de dois anos acabei por me afastar da comunhão. Sentia que Deus queria uma coisa e eu não queria fazer a vontade d’Ele, apesar de dizer-mos sempre o contrário no Pai Nosso – “Seja feita a Vossa vontade”. Para mim, na altura, não fazia sentido comungar. Ainda assim, mantive-me no secretariado de catequese, no grupo de leitores, como catequista, e continuei a fazer o doutoramento.
Ao longo desse tempo de doutoramento, tive uma fase inicial em que me senti muito em baixo, muito dividido por não querer seguir o chamamento de Deus. Até que percebi que a minha vida só poderia fazer sentido e eu só poderia sentir-me bem comigo mesmo se esquecesse a ideia de uma carreira científica e fosse para o seminário. Ainda assim, concluí o doutoramento, tanto que defendi a tese quando já estava na primeira semana no Seminário do Bom Pastor, para onde fui fazer o ano propedêutico. Depois, ao longo do curso de teologia, o facto de ter tirado um curso antes ajudou-me bastante, não só a sistematizar melhor as várias matérias, a organizar melhor o meu estudo, etc…, mas também na própria tese de mestrado, onde acabei por voltar um bocadinho ao tema da minha tese de doutoramento – a evolução. Debrucei-me sobre a possibilidade de uma relação entre a criação como ato divino e a teoria da evolução (com enfoque na evolução molecular) em que tinha trabalhado em laboratório, durante sete anos. Com base nos estudos que fiz para a tese de mestrado, concluí que o facto de ter havido um ato criador por Deus, em nada contraria a possibilidade da evolução; muito pelo contrário, a teoria da evolução acaba até por enriquecer esse ato criador de Deus uma vez que foi um ato criador que permitiu que as espécies se continuassem constantemente a recriar.
Para mim, hoje em dia, um padre tem de ser uma pessoa especialmente disponível para o povo que lhe for confiado, para a escuta, para estar atento a quem o rodeia, disponível para o que for necessário. Tem de ser uma pessoa atenta e não só para quem o rodeia… Hoje em dia, num tempo de crise como este, há muita gente que passa por uma pobreza envergonhada, começa a ter dificuldades e não tem coragem de o assumir e pedir ajuda. Esse é um dos aspetos em que um padre dever ser uma pessoa atenta. Isso alicerça-se, sobretudo, numa relação diária com Deus que nos permite estar atentos aos sinais que Ele nos vai dando. Eu nunca pensei em ser padre, mas o facto de ter sentido que Deus me chamava, pela coincidência de uma homilia e de uma mensagem de telemóvel, implicou que tivesse de estar aberto a Deus, que nos pode chamar das mais diversas maneiras. Como o Papa diz hoje em dia, “até os próprios meios de comunicação acabam por ser ferramentas para Deus se fazer chegar”.
Para além disso, um padre também deve ser alguém que tenta perceber as potencialidades daquilo que o rodeia. Numa paróquia há sempre diversos movimentos, cada um com a sua essência, cada um com o seu carisma, e essa diversidade que se encontra nos diferentes movimentos tem, acima de tudo, uma potencialidade que permite uma maior unidade da Igreja quando há alguma comunicação e partilha.
Filipe Ramos dos Santos de Malta, Vila do Conde
Eu sou o Filipe, tenho 27 anos e sou da paróquia de Malta, Vila do Conde. Nasci numa família cristã e desde cedo acompanhei os meus pais na Eucaristia, frequentei a catequese e fiz parte do coro, acompanhando o meu avô nos ensaios. Por volta dos meus 10/12 anos, surge o primeiro chamamento de Deus de querer fazer parte desta grande família que são os sacerdotes. Mais tarde, na adolescência, esse entusiasmo acabou por cair um bocadinho e só depois aos 16/17 anos é que se dá uma grande transformação na minha vida. Foi nesse momento que decidi procurar e entrar no seminário. Essas mudanças significativas na minha vida acontecem por vários motivos; talvez o mais forte tenha sido o falecimento do meu pai que me levou a questionar várias vezes o porquê daquilo, a existência de Deus, etc… Levou-me a procurar este Jesus que podia estar um pouco esquecido. A partir daí, acho que O encontrei e me predispus a segui-Lo com mais entusiasmo, com mais vontade e força.
Dá-se, assim, a minha entrada no seminário. Junto do pároco da minha freguesia, procurei perceber como é que podia recorrer à entrada no seminário. Visitei algumas vezes o seminário até que depois, aos 17 anos, decidi mesmo entrar no Seminário do Bom Pastor, onde vivi durante 3 anos. Depois dá-se a transição para o Seminário Maior do Porto, onde vivi durante 6 anos. Depois entrei na fase pastoral, onde fui colocado nas paróquias de Meinedo, Caíde de Rei e Lodares, em Lousada, acompanhando o pároco dessas mesmas comunidades.
Para mim, ser padre/sacerdote, hoje, é ser próximo das pessoas, acompanhá-las naquilo que elas mais necessitam porque nota-se que, em algumas situações, as pessoas se sentem sós e abandonadas. Ser sacerdote, hoje, é estar junto delas, é acompanhá-las. É preocupar-se também com os mais jovens e com os mais novos que, muitas vezes, não encontram respostas para os seus anseios; mas mais do que responder e dar muitas respostas, é importante estar ao lado deles e, assim, crescermos todos juntos em comunidade para sermos uma família de Cristo, maior, mais educada, mais nobre e mais sólida.
João Miguel Moreira Azinheira de São João da Madeira
Olá a todos! Eu sou o João Azinheira, tenho 29 anos, sou de S. João da Madeira. Estive a estudar em Aveiro e foi lá, quando estava a estudar Biologia, que, de alguma forma, me senti inquietado e tocado. Paralelamente ao meu percurso em Aveiro, também andava nos escuteiros. Sou escuteiro, e o meu percurso enquanto caminheiro fez-me aprofundar um bocadinho a minha vida da fé e a espiritualidade. O facto de ter de escolher entre dois caminhos, com a ajuda dos meus chefes e de todos os meus irmãos escutas, fez-me optar por este caminho e fez-me questionar: “Porque não? Porque não ser sacerdote? Porque não servir a comunidade e a Igreja? Porque não responder a este chamamento? – mesmo que na altura ainda não tivesse bem a noção do que isso era”.
Então, foi em Aveiro que comecei a procurar locais onde pudesse refletir e aprofundar melhor se seria este o meu caminho. Continuei o meu curso, mas não o cheguei a acabar. Refugiei-me muito na oração que melhor conhecia – a oração do rosário. Lembro-me perfeitamente que na residência, com os outros estudantes, eu fechava-me no meu quarto e às 21h30 rezava o terço, sintonizado com Fátima. Isso era muito importante para ultrapassar aqueles obstáculos que ia pondo à minha resposta, à vocação que me estava a ser feita. Por fim, apresentei-me ao meu pároco e fiz-lhe a proposta de ingressar no seminário. Lembro-me da surpresa do Sr. Padre Milheiro quando lhe disse que ia entrar no seminário, e ele fez questão de me encaminhar para o Seminário Maior de Nossa Senhora da Conceição, da Sé. Mantive-me lá durante seis anos, com formação intelectual e pastoral. Para mim, o seminário foi muito importante, não só por esta questão da formação, do contacto e do alargar de horizontes que tive com todos com quem passei, mas também com o aprofundar da minha própria fragilidade e de como a usar no serviço a Deus, à Igreja e à comunidade. Passados estes seis anos, os anos de pastoral, fui estagiar para Rio Tinto. Em Rio Tinto tive contacto com o Sr. Padre Avelino Jorge e, agora, com o Sr. Padres Vítor Ramos que me ajudaram muito. Foram autênticos irmãos mais velhos que nos dão umas “linhas mestras” daquilo que deve ser a pastoral – uma pastoral de proximidade, uma pastoral de abnegação em prol do serviço maior que estamos a prestar.
O meu pároco, o Padre Álvaro, costuma dizer que nós estamos lá para o povo, para as pessoas, estamos ao serviço. Se estamos ao serviço, devemos fazê-lo com humildade. O meu percurso nos escuteiros fez-me sempre usar o lema “Sempre alerta para servir”, portanto é algo que eu desde pequenino tenho ouvido, e também o fui aprendendo com a minha família – estar sempre disposto a servir aqueles que comigo se cruzam.
Ser padre, hoje, é ser uma pessoa humilde, abnegada, e ser uma pessoa que está presente sempre que alguém precise de nós, sempre que alguém precise de uma palavra de apoio, sempre que alguém precise que lhe falem de Deus, sempre que alguém precise de um conselho. Um padre deve ser presença na comunidade, deve ser a imagem em espelho de Jesus, o Bom Pastor.
Pedro Manuel Lopes da Cunha de Besteiros, Paredes
Eu sou o Pedro, tenho 28 anos e sou da paróquia de S. Cosme e S. Damião de Besteiros.
Recordar a história da vocação é trazer à memória muitos dos que me foram acompanhando ao longo dos últimos anos – desde a minha família, os meus pais, o meu irmão, onde dei os meus primeiros passos na fé, aos meus catequistas e aos grupos paroquiais por onde fui passando. O meu primeiro contacto com o seminário dá-se aos 12 anos, quando fui convidado para uns encontros de fim de semana de pré-seminário. Nessa altura, até cheguei a considerar ingressar no Seminário Menor, mas, entretanto os anos foram passando, houve um discernimento que ficou por fazer, e fui fazendo o percurso normal.
Só mais tarde, um bocado contra as expectativas daqueles que me eram mais próximos, acabei por fazer um discernimento mais sério e por volta dos 17/18 anos ingressei no Seminário. E assim se passaram seis anos de formação e dois anos de pastoral. A vida em seminário é um bocado feita pela formação académica, mas também, essencialmente, por este crescimento que é feito num contexto entre colegas e amigos, no contacto que vai havendo entre a equipa formadora e os alunos. Após estes seis anos de formação mais académica acabamos por entrar num aprofundamento mais pastoral, onde estagiámos durante dois anos numa paróquia.
Para mim, o ministério sacerdotal passa muito pela presença. O padre faz-se presente nas comunidades e predispõe-se a escutar aqueles que vão passando. Ser padre, hoje, também passa muito por promover este caminho sinodal do qual se tem falado muito. Este caminho sinodal faz-se, não só nas grandes questões e nas grandes coisas, mas também nos problemas diários das nossas comunidades. É preciso saber promover esta fraternidade e este trabalho comum nas nossas comunidades.
RS e LC