Toda a Sagrada Escritura é a história de um povo, embrião de uma nova humanidade, criado por Deus para a felicidade e para a consolação que lhe advêm da experiência do convívio entre Criador e criatura, que O aceita pela fé. Mas é no Novo Testamento que mais se ressalta esse dom do contentamento e da felicidade. Aliás, a palavra “Evangelho” quer dizer, precisamente, anúncio de uma alegre notícia, boa nova de alegria. Por isso, S. Paulo viria a sintetizar as atitudes que nascem das palavras e das atitudes de Jesus na conhecida expressão: “Sede alegres na esperança” (Rm 12,12).
Que é a alegria, esse imenso valor não disponível no comércio? É um estado de alma em que a pessoa se sente bem, entusiasmada, bem-disposta, íntegra, não dividida contra si mesma ou contra os outros. É um sentimento no qual a vida resulta menos amarga e como que se não dá conta da dureza do solo que trilhamos. É a grande vacina contra aquele pessimismo que nos leva a considerar o tempo que nos é dado viver como um dos mais difíceis da história. O que é mentira e só gera sentimentos de angústia, dúvida e desespero. Na vida pessoal e na vida da Igreja.
A tristeza é sempre paralisante: não entusiasma, não comove, não move. Encerra-nos numa concha que é o contrário da fermentação do mundo. É ficarmos fechados no Cenáculo, quando os homens e as mulheres “provenientes de todas as nações que há debaixo do céu” (At 2,5) reclamam uma Palavra de salvação.
Neste sentido, opõe-se à “alegria do Evangelho”, exprime falta de confiança e de fé naquele Senhor que nos garantiu estar sempre connosco até ao fim dos tempos (cf. Mt 28,20) e é contrária à missão da Igreja chamada a ir e anunciar (cf. Mc 16,15). Precisamente a partir desta persuasão, no Pentecostes do Ano Santo de 1975, o Papa São Paulo VI lançou um veemente apelo sobre a necessidade de os cristãos voltarem às fontes da alegria que brota da certeza de que Deus está connosco, jamais nos abandona e nos garante um sentido para a história. Quem vive n’Ele pela fé e pelo Batismo não pode ter outra postura que não seja a de ser um portador do sadio otimismo, um empenhado na descoberta dos aspetos positivos dos acontecimentos, enfim, um mensageiro da alegria.
A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023 constituirá, certamente, uma explosão de alegria, de festa, de ânimo. A Igreja em geral e nós, Diocese do Porto, em particular, não podemos desperdiçar esse entusiasmo. A partir dele, construiremos uma “Igreja em saída”, um ousado dinamismo missionário, uma nova etapa evangelizadora marcada pela alegria, como refere este Plano e o Papa tanto recomenda (cf. EG 1). Neste sentido, o tempo pós-Jornada será crucial. Assim saibamos nós canalizar o dinamismo gerado.
Evidentemente, não podemos perder, mas integrar as grandes propostas e desafios da Igreja deste tempo, muitas das quais já entraram em Planos anteriores: a reconstituição da comunidade eclesial muito afetada pela crise da pandemia, as atitudes determinantes do acolhimento e da hospitalidade, a sinodalidade como o grande desafio da Igreja neste terceiro milénio, o projeto de fazer desta uma Diocese mais ministerial e a esperança, a grande temática que nos vai ser proposta no contexto do já anunciado jubileu do ano 2025. Que a voracidade do tempo não nos leve a esquecer estes âmbitos e a situar-nos apenas num que, isolado dos outros, não exprimiria o sentir da Igreja.
Irmãs e irmãos diocesanos do Porto: como um dia pregou o Papa Francisco, a alegria é o autêntico “respiro do cristão”. É dom do Espírito, inerente à fé, sempre em tensão entre a memória da salvação e a esperança. A alegria é a consolação do Espírito Paráclito, é o soltar as amarras da alma e da Igreja para a longa navegação em alto-mar. Porventura, difícil. Mas sempre entusiasmante.
Que o nosso Bom Deus deposite o dom da alegria no coração de cada um e em toda a nossa Diocese do Porto.
O vosso irmão,
+ Manuel, Bispo do Porto
Nota: em setembro, haverá uma versão editada (em pdf) e uma publicação impressa do livreto do PDP 2023-2024, com calendário mais desenvolvido.